domingo, 23 de dezembro de 2012

A Festa

Hoje traduzi poemas do aramaico,
Regozijei com o encontro de faixas esquecidas a ganhar pó
Em velhos discos
Mudei a cor do cabelo, organizei o calendário
Para as próximas três décadas
Da minha vida
Mas não fiz o que mais importava

Hoje aprendi a arte difícil da sensatez,
Da discrição e da paciência
Bordei pensamentos ternos e tenazes
Em fios de cobre
Não quis saber das articulações e entretive-me
A pular entre nuvens
Mas não fiz o que mais importava
 
Hoje vesti, com mil rubores vaidosos
Um vestidinho florido que me fez frio
Sorri, ignorei
Porque me espelhava pela casa silenciosa
Como uma Primavera
Recusei a rima fácil com o sublime nome da estação que eu era
Mas não fiz o que mais importava

Hoje eu pensava-me impecavelmente preparada
Para a festa
Do princípio do mundo
Que é ser em alegria inusitada
Essa que a expectativa acalenta e embala
Nos alienados rigores do tédio
Mas não fiz o que mais importava

Não, não fiz o que mais importava
Na minha pouca jornada
No esmaecer da espera
Não vi o que mais importara
Pela inércia fria dos meus dedos,
Precípite quebrou-se uma pobre quimera
Perdi o curso do rio, errei a estrada
Não fiz o que mais importava
Não fiz o que mais importava
E agora vogo
No mar nado-vivo
De talvez nada
Seca sem queimar e deserdada
Daquilo que desde então
E desde sempre
Mais importava

3 comentários:

Anónimo disse...

fiz o que mais importava e li este belo poema.

Tamborim Zim disse...

Tanto obrigada! Como canta o Milton, "Amigo é coisa se guardar no lado esquerdo do peito" :)

Anónimo disse...

Tanto "desobrigada"! :)