quarta-feira, 14 de março de 2012

Tamborim Zim Entrevista* … Luísa Ribeiro

Luísa Ribeiro

Poeta


“(…) procura o silêncio e quando fores para o papel torna-te insólito e escreve de maneira que não te compreendas quando te releres.”


 TZ - Luísa, grata decassilábico por aceitares este convite! No Quarto 666, do Wim Wenders, o Godard diz que o grande desafio do cinema é mostrar o invisível, o que este realizador considera o incrível, exactamente o não visto. Pergunto-te: como poeta, qual é o teu maior desafio? O que é que te mais urge mostrar num poema?

LR - Grata fico eu ao ser confrontada com esta pergunta inicial. Nem sei sefique a deambular sobre Godard ou mesmo sobre Wim Wenders, ou se vá directamente para o meu maior desafio. Penso que a poesia tem grande alimento na imagem e por isso apetece-me pendurar neste pensamento do Godard. Ora, o grande desafio do poeta não será também dar forma ao invisível? Pois, para mim a poesia canta e lembra o pormenor tantas vezes esquecido e brinca com a sua própria matéria: a língua.O desafio é dizer com contenção, e ao mesmo tempo, ter sempre a simplicidade presente e desorganizar a gramática. Não sei se me urge mostrar algo no poema ou se o poema é que me convida a viver com ele.

TZ - Detive-me na contenção: por que razão te impões conter? Para defenderes a tua identidade mais subterrânea, porque te agrada mais esteticamente, por uma espécie de austeridade (!) espiritual da palavra poética?
  
LR - No poema deixo florescer aquilo que tão bem chamas de identidade mais subterrânea. Aliás, o poema desce aos confins daquilo que mais nos faz diferentes uns dos outros e traz à superfície as nossas inquietações, ou o nosso espanto perante aquilo que é belo e nos faz ir em frente. O prazer da contenção está na possibilidade de conseguir dizer com o menor número de palavras possível.

TZ - Tenho ideia, correndo o risco de ser precipitada, que a tuapoesia incide em estados muito intensos e muito suaves, de gato vagaroso ao sol. Não obstante o que disseste sobre a contenção do dizer, é possível, fácil ou sequer desejável, para ti, exprimires disposições de alma intermédias, quero dizer, entre esses dois estados?
  
LR - Bem, não posso e não quero julgar a minha poesia, mas o que sinto pela poesia, e por qualquer outra forma de expressão artística, é que tudo acontece ou nos picos ou nas catacumbas. As disposições de alma intermédias fazem parte da apatia e é nesse momento que a alma ficadormente e não transmite ao corpo emoção.

TZ - Se te pedisse que me identificasses três dos teu poemas preferidos, quais seriam? Atenção, não têm de ser teus...

LR - Mas existem poemas que não sejam meus?

TZ - Tamborim Entrevista Produções pede desculpa por este indesmentível e lamentável lapso: tens toda a razão. Três dos teus poemas?

LR  - Risos mil, Tamborim. Na verdade, como sabes, é impossível ter três poemas destacados dos outros. Só te poderia adiantar quais os poetas que estão quase sempre à minha cabeceira, mas mesmo assim rodam. Não me posso separar do Paul Celan e nem do Rilke. E tenho alguns portugueses sempre à mão: Nuno Júdice, Daniel Jonas, Casimiro de Brito, Jaime Rocha, Rui Nunes.

TZ - Então na senda de um dos teus predilectos, o que dirias sumariamente a um jovem poeta que te procurasse para um conselho, um indício de chão?
  
LR -  Eu? Pobre de mim. Dir-lhe-ia: lê muito, vê muita pintura, ouve música, anda descalço na areia, sai de casa à hora que os outros entram, procura o silêncio e quando fores para o papel torna-te insólito e escreve de maneira que não te compreendas quando te releres.

TZ - Eh bien! E finalmente...alguma pergunta que não tenha sido formulada nesta entrevista e a que gostasses de responder?
 LR - Deixa cá pensar... Talvez seja mesmo esta pergunta.


* Entrevista publicada anteriormente no meu FB. Obrigada Luísa!

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